Testemunhos

DOCENTES

Memórias do Mestrado em Escultura na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa

Considero, exagero naturalmente à parte, que o Mestrado em Escultura foi criado e lecionado por três professores, uma espécie de três mosqueteiros, de toda esta história: os Profs. Doutores António Matos, João Duarte e José Fernandes Pereira, este último de saudosa memória.

Fui convidado pelo Prof. Doutor António Matos, que era então o coordenador do Mestrado em Escultura, e convencido pelo Prof. Doutor José Fernandes Pereira a lecionar a cadeira (atualmente com a designação mais científica e complexa de unidade curricular) de Metodologias de Investigação. Tinha realizado o meu doutoramento em 2007 e sempre tive um enorme fascínio pela Escultura, talvez por preferir a terceira dimensão, sempre mal vista por estar associada ao mais pecaminoso sentido, o do tato (aliás, o último, mas o mais elevado presente no Escadório dos Cinco Sentidos, no Bom Jesus de Braga, por ser o pior de todos), possivelmente pela minha licenciatura em Design de Equipamento, na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa e por uma paixão pela Arquitetura.

Dessa primeira edição do Mestrado em Escultura, no ano letivo de 2007-2008, recordo os alunos (e peço desculpa se me esqueço de algum): Ana, Bruno, Celso, Elsa, Érica, Fernando, Isabel, Jaime, Luís e Sandra.
As aulas eram na antiga sala de Anatomia (3.63), hoje Heritage Lab, e o horário, um surpreendente, de facto, pós-laboral: sábados, das 9 às 13 horas. O horário até conseguia apresentar vantagens: uma aluna, que dava aulas no ensino secundário, vinha de propósito, sábado de manhã, do Algarve e um outro surgia na sala de aula depois de uma direta passada no Bairro Alto.
Tenho a impressão de que todas as outras cadeiras do Mestrado em Escultura eram à quinta ou sexta-feira.
O conselho dos meus três colegas foi simples: tentar ensinar Metodologia de Investigação; como o Prof. Doutor António Matos repetia, vezes sem conta: os mestrandos e futuros mestres em Escultura tinham de saber citar, organizar uma bibliografia e conhecer a Norma Portuguesa 405. O livro por nós adotado foi, logicamente, o genial Como se Faz uma Tese em Ciências Sociais, de Umberto Eco, que já tinha sido para mim essencial aquando do meu mestrado e respetiva dissertação em História da Arte, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade Nova de Lisboa.

Na época em que fiz o mestrado, não existia qualquer cadeira de metodologia e os mestrandos liam com muita atenção Umberto Eco e uma das suas maiores obras, pois era impensável questionar qualquer um dos nossos professores sobre como citar, fazer uma nota de rodapé ou organizar uma bibliografia.
Do Mestrado em Escultura, recordo que todas as semanas eu vivia uma verdadeira angústia, que surgia logo pela terça ou quarta-feira, em relação aos sábados de manhã e que consistia em preparar e rever matéria e em elaborar uns horríveis PowerPoints (pobres mestrandos…), do mais minimalista que se possa imaginar: fundo branco e letra Arial preta, sem uma única imagem (pois, para isso, os mestrandos tinham as peças escultóricas ou a cadeira de Teoria e História da Escultura), repletos de exemplos e formas de construir índices, introduções, capítulos, conclusões e ainda os inevitáveis idem, ibidem, ibid., op. cit., p. e pp. etc. Aliás, neste último ponto, lembro que era muito confuso explicar devidamente o que deveria ser uma nota de rodapé e a respetiva mecânica.

Nas primeiras edições do mestrado, havia poucos ou nenhuns exemplos em todo país de dissertações para ir buscar inspiração… Se, por um lado, era algo angustiante, por outro, tratava-se de um verdadeiro desafio: tudo o que os alunos escolhessem e realizassem como tema para as dissertações era, fatalmente, original e inédito, tendo surgido, nessas edições iniciais, inventários, monografias e diversos trabalhos que abordavam questões técnicas e materiais, como, por exemplo, o trabalho escultórico em pedra, ferro, gesso ou a fundição, entre outros.

Por fim, entre os vários conselhos que me deu o Prof. Doutor António Matos, há um que posso e devo revelar e que ainda hoje me acompanha: o mestrado é método. Uma dissertação não é um texto literário ou um poema, é apenas método. Quem não sabia o método e as respetivas metodologias de investigação do trabalho científico estava condenado a não ser mestre nenhum, muito menos em Escultura.

Eduardo Duarte
Professor Auxiliar Agregado

Perspetivas Contemporâneas do Mestrado em Escultura da FBAUl

Perspetivas Contemporâneas do Mestrado em Escultura da FBAUL

Concebemos a Escultura como uma prática intrinsecamente teórica e prática, e acreditamos que as exigências e aptidões essenciais que deram origem às primeiras obras escultóricas se mantêm relevantes nos dias de hoje. O desenvolvimento de competências, como análise, síntese, aprendizagem, resolução de problemas e aplicação de conhecimentos, permanece uma prioridade, sempre com a preocupação pela qualidade e a habilidade de trabalhar tanto individualmente como em grupo.

O Processo de Bolonha exigiu uma profunda reformulação do conceito de Universidade, tornando-a acessível a uma vasta população estudantil, refletindo um novo estágio civilizacional. Este processo visou, além da reforma do ensino, transformar mentalidades, promovendo a mobilidade entre estudantes, professores e investigadores e gerando uma nova consciência social europeia. O objetivo seria transformar o espaço europeu numa entidade cultural unificada, respeitando e valorizando a diversidade e a identidade cultural de cada indivíduo.

A criação de um Espaço Europeu de Ensino Superior, coeso, compatível e competitivo, foi fundamental para fomentar a mobilidade de estudantes e docentes, o que levou à uniformização das competências académicas. A par de outras reformas, adotou-se a estrutura dos três ciclos de estudo e a transição para um modelo orientado para o desenvolvimento de competências, em vez da transmissão de conhecimentos. Este modelo tem uma mudança significativa no foco da educação, centrando-se no aluno e nas suas escolhas, direcionadas para objetivos específicos de aprendizagem. Promove-se a responsabilidade do estudante na gestão do seu percurso académico, respondendo a competências cognitivas, metodológicas, tecnológicas, linguísticas, individuais e sociais. Este paradigma aproxima-se de uma visão mais antiga, que valoriza mais o conhecimento do que a mera aquisição de saberes. Conectando-se à ideia de Universidade, baseada na universalidade e excelência, o modelo oferece um núcleo estruturante de disciplinas e uma vasta gama de opções que permitem ao aluno personalizar o seu percurso, ao mesmo tempo que promove uma oferta curricular diversificada, incentivando a diversidade cultural.

A reforma do ensino superior alterou não só os paradigmas, mas também reduziu a duração dos cursos. Na área de Escultura, que exige uma formação profunda e maturidade, a redução da duração dos cursos de cinco para três anos tornou-se um desafio. Com a impossibilidade de manter cursos de cinco anos, o modelo 3+2, adotado pela Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, impôs o desafio de formar escultores competentes em três anos, oferecendo posteriormente uma especialização de dois anos.
O Mestrado em Escultura da Faculdade de Belas-Artes UL nasce assim, para valorizar a diversidade e promover a experimentação, oferecendo um ambiente de pesquisa teórico-prática, onde os alunos podem explorar linguagens, formas e espaços para desenvolver abordagens e linguagens individuais. O curso é adaptável aos interesses dos alunos, contemplando áreas como Escultura em pequeno, médio e grande formato, intervenção na natureza, integração em espaço público e o desenvolvimento de poéticas pessoais.

A formação técnica é abrangente, incluindo técnicas tradicionais e emergentes, tanto analógicas como digitais. Áreas como modelação, modelação digital, talhe e construção são desenvolvidas em Laboratórios dedicados a madeira, metais, pedra, cerâmica, gesso, meios digitais, medalhística e plásticos. O ensino combina aulas teóricas e tutoriais individuais, onde os alunos apresentam e discutem o seu trabalho, adquirindo gradualmente uma compreensão crítica do seu trabalho no contexto da escultura contemporânea.

Este ciclo de estudos foi concebido para valorizar e incentivar os interesses individuais de investigação dos alunos, promovendo um ambiente de aprendizagem que equilibre amplitude programática com especificidade de conteúdos. O mestrado permite que os alunos se apropriem do seu percurso académico, proporcionando-lhes as ferramentas necessárias para aprofundar a sua identidade artística e intelectual. Privilegia-se a pesquisa individual supervisionada, oferecendo ao aluno a oportunidade de explorar e aplicar as aprendizagens adquiridas nos anos anteriores de modo autêntico e criativo. Este processo culmina na criação de resultados artísticos originais e na formulação de um plano de investigação autónomo, que define o rumo do seu trabalho na escultura.

O curso está estruturado em unidades curriculares obrigatórias e opcionais, organizadas em aulas e tutorias que respondem aos interesses e necessidades de investigação de cada estudante. Cada unidade curricular proporciona uma abordagem prática e teórica, permitindo aos alunos desenvolver competências técnicas, críticas e criativas ao longo do curso. A especialização exige níveis elevados de experimentação e pesquisa, tanto em termos teóricos como práticos, ou numa combinação de ambos, dependendo dos objetivos individuais de investigação. O curso visa proporcionar não só conhecimentos técnicos, mas também estimular os alunos a pensar criticamente sobre a sua prática escultórica, promovendo uma abordagem mais inovadora à escultura contemporânea.

O Mestrado em Escultura exige um compromisso significativo dos alunos com o seu percurso académico, esperando-se que estes sejam capazes de assumir a responsabilidade pela definição dos seus objetivos, pela gestão eficaz do tempo e recursos e pela tomada de decisões autónomas ao longo do curso. Este nível de autonomia e autossuficiência é essencial para que os alunos possam explorar o seu potencial criativo e intelectual de modo pleno. Além disso, o programa incentiva a reflexão e a criação de ideias inovadoras que desafiem as convenções estabelecidas no campo da escultura, promovendo uma abordagem crítica à prática artística. Em vez de seguir normas ou tradições predefinidas, os alunos são incentivados a questionar o papel da escultura na sociedade contemporânea e a repensar as suas práticas dentro deste contexto.

É também esperado que os alunos adquiram uma compreensão profunda do contexto histórico da escultura e das questões contemporâneas que afetam a prática artística atual. Através da análise de diferentes períodos históricos, movimentos artísticos e debates teóricos, os estudantes são estimulados a refletir sobre como esses fatores influenciam a sua própria produção artística. O desenvolvimento de uma linguagem escultórica própria, capaz de expressar as suas ideias de modo singular, é um objetivo central do curso. Esta linguagem não é apenas técnica, mas uma maneira de pensar e comunicar através da arte, essencial para o aprofundamento das aprendizagens ao longo da formação.

Ao longo do mestrado, os alunos são orientados a cultivar competências cognitivas, metodológicas e laboratoriais que lhes permitem construir uma base sólida de conhecimentos teóricos e práticos. Essa base serve de alicerce para a sua expressão artística e para a criação de discursos plásticos originais. A prática experimental ocupa um lugar central no curso, pois é através da experimentação contínua que os alunos têm a oportunidade de explorar novas formas e novas ideias, desafiando os limites da escultura tradicional. Este processo experimental é uma ferramenta vital para o desenvolvimento da criatividade e da inovação, permitindo aos alunos ultrapassar desafios e explorar territórios artísticos inexplorados.
Além disso, o percurso académico oferece aos estudantes a aquisição de uma vasta gama de competências científicas e técnicas fundamentais tanto para a prática quanto para a teoria da escultura. A capacidade de aplicar esses conhecimentos de modo eficaz nas produções artísticas é um dos principais resultados esperados do mestrado. O curso também incentiva uma abordagem interdisciplinar, promovendo a exploração de conhecimentos científicos e artísticos em áreas complementares. É um envolvimento com outras áreas do saber que contribui para uma formação mais rica, expandindo as possibilidades formativas dos alunos e construindo um perfil artístico mais completo e plural.

Em suma, o Mestrado em Escultura oferece uma formação exigente, mas altamente gratificante, permitindo aos alunos desenvolver a sua identidade artística de modo autónomo e aprofundado, enquanto adquirem competências essenciais para a sua prática profissional.
Ao longo do curso, os estudantes terão a oportunidade de refletir criticamente sobre o papel da escultura na arte contemporânea, experimentar novas técnicas e conceitos, e criar um corpo de trabalho original que reflete a sua visão única sobre o mundo.

João Castro Silva
Escultor, Professor Auxiliar Agregado

INVESTIGAR EM ESCULTURA

Investigar em Escultura

Ao Professor Escultor António Matos

No enquadramento das unidades curriculares da Teoria e História da Escultura e Teoria e História da Escultura Pública por nós leccionadas no Mestrado de Escultura a convite do Professor Escultor António Matos, entre os anos de 2011 e 2018, considerámos que a investigação em Escultura implicaria, desde logo, investigar o meio da Escultura, isto é, o espaço. Sem esquecer que, no limite, uma obra de arte é em si mesma o resultado de um processo de investigação material e conceptual, procurámos também neste contexto dar cumprimento ao princípio de que na actividade humana a dimensão prática é indissociável da dimensão teórica. Por outro lado, procurámos responder a uma dupla necessidade: dar continuidade pedagógica ao ensino da representação como modo estruturante do fazer escultórico através dos exemplos apresentados, e problematizados, e integrar os contributos que, ao longo do século XX e XXI, re-apresentam a Escultura nos seus diversos modos de fazer e pensar, procurando manter uma coerência no domínio da investigação da prática escultóricas.

As bases da investigação artística por nós proposta visaram consequentemente um conhecimento perspéctico da prática escultórica na contemporaneidade em contraponto permanente com exemplos da prática escultórica de tempos recuados, tendo como objectivo não apenas a superação de uma concepção historiográfica estanque ou positivista dos vários períodos da história mas sobretudo o desenvolvimento das possibilidades de formalização da sensibilidade inteligente da mão humana. Simultaneamente, a exposição e o diálogo crítico acerca das obras e dos temas expostos e lançados à discussão foram seleccionadas em função do desenvolvimento crítico de vocabulários e gramáticas possíveis para a concepção e a realização de obras escultóricas por parte dos alunos, assim como da progressiva constituição de um pensamento escultórico.

Há, porém, pressupostos da investigação em Escultura que sempre julgámos necessários para a condição maior de um Escultor, a saber, o ensino e a aprendizagem mútua da percepção da presença sensível do mundo. Vários poderão ser os exemplos na vida de todos os dias, a saber, refazer os contornos das margens de um rio no passo demorado e cuidadoso do caminhar, depois de uma rigorosa observação do vaguear das suas águas, intuindo que o rio une, não separa as margens; apreender, a partir do nosso corpo situado, os limites de uma estátua numa praça pública, as suas relações com o espaço circundante, e bem assim as suas variações quando a luz nela reflecte; riscar uma pedra, escavar um espaço, riscar um pedaço de papel, e nele acumular, em sucessivas camadas, grafite, ou cinza de grafite; rasgar o papel e assumir nesse gesto a dimensão performativa que habita a Escultura; criar transparências através do derramamento de cera ou parafina nas formas escultóricas mais ou menos abstractas; diluir completamente essas formas, apreender a impressão difusa da atmosfera que separa o nosso corpo do corpo do objecto; captar o movimento, desejo sonhado desde a Escultura grega clássica até aos mobiles do século XX. Por esta razão, a Escultura é, no seu momento inaugural e na mais plena acepção do verbo ser, um confronto com o espaço físico, a que o acontecimento da própria existência está intrinsecamente ligado; o escultor de há muito que o sabe e o poeta segue-o nessa sabedoria antiga, por isso o desenho e a poesia são também os companheiros inseparáveis do Escultor.

Na sua perspectiva histórica, a Escultura nasce como volume fechado, emanado de um centro à volta do qual gravita a figura “encontrada” pelo talhe certo ou pela modelação virtuosa do Escultor, segredo que Miguel Ângelo revelou em obras e poemas. A matéria oferece-se à inteligência da mão ensinada pelo ver do desenho, trazendo à presença a presença própria da existência humana: a verticalidade da vida, a horizontalidade da morte. Se a Vénus de Willendorf poderá caber na nossa mão, os túmulos de Dona Inês e D. Pedro, em Alcobaça, rompem a escala aparente da presença do ser humano na terra, e nesse sentido a história da Escultura é também a Escultura do mundo. Nada pode escapar à arte da Escultura, se por ela entendermos a formalização da presença do ser humano no mundo. A Escultura traz ao visível, mas também ao sonoro e ao táctil, o que de imponderável, inefável e mistérico está latente na existência humana. Historicamente, o plinto vai também desaparecendo como suporte da Escultura; Rodin traz o seu malogrado Balzac para o mesmo chão que pisamos, e as relações entre o corpo humano e o objeto vão-se alterando, correspondendo doravante a uma nova formalização das relações com os objectos que nos rodeiam. Outrora fechado sobre si mesmo, o volume figurativo começa a ser escavado sob a vigilância do tempo: nas ilhas Cíclades os escultores já duvidavam desse mesmo centro, sabiam, como Goethe soube bem mais tarde, que a presença dos corpos nem sempre se apresenta de modo visível aos olhos do rosto, sobretudo tendo em conta que o espaço habita os corpos vazados. A escultura reduziu os volumes, contrarelevos foram colocados nos cantos formados por duas paredes, a transparência da própria matéria veio à superfície como luz na utilização do âmbar ou de materiais sintéticos. Construíram-se bustos por meio de planos geométricos igualmente transparentes, vemos o interior das formas, estamos perante um simulacro do vazio, apenas um simulacro, o espaço é contínuo, rodeia, habita a Escultura. Radicalizou-se a investigação do espaço como meio da Escultura. A própria pintura como plano delimitado pela tela engradada com tintas à superfície é vista pelo Escultor como um plano espacial delimitado sobre o plano espacial da parede. A instalação pressupõe a unidade espacial entre os seus elementos, aparentemente rarefeitos na repetição dos seus módulos; o plano delimitado da Escultura enquanto “tapete” comprime o seu “centro” no confronto com o espaço arquitectónico que o acolhe, redefinindo das relações da Escultura e da arquitectura: espaços fechados, espaços abertos, espaços interiores, espaços exteriores, delimitações de uma espacialidade que se abre progressivamente a si mesma, que ganha uma dimensão metafórica, simbólica, performativa.

Quatro Cadeiras à volta de um centro vazio poderá ser uma metáfora da democracia, isto é, uma metáfora do diálogo que este sistema político implica por parte dos seus intervenientes, e o espaço vazio da cadeira pressupõe metaforicamente uma rotativa ocupação; um palácio inacabado, com algumas das suas colunas no chão arruinadas pelo tempo, simbolicamente representado pela fonte cujas águas se deitam no espelho (de água) sobre o qual aquela se majestosamente se erige, poderá ser também um Monumento ao 25 de Abril; a revolução é sempre a revolução da sociedade, vista metaforicamente como um palácio cuja construção se iniciou naquele dia de Abril, sendo que os avanços e retrocessos políticos, segundo a visão do Escultor, impediram não só a sua finalização como o derrube das algumas das suas progressivas conquistas, igualmente metaforizadas nas colunas caídas do palácio visto como “edifício social”. Há também exemplos de colunas que erguem ao céus, ruínas que nos induzem ao constante refazer mítico do mundo e do seu significado, ou uma simples deposição de um olhar sensível sobre a representação polida de um rosto que repousa numa discreta mísula que abandonadamente o suporta.

Ora, a possibilidade de constituição de uma ontologia da Escultura como uma ontologia da presença dos e nos objectos escultóricos, isto é, enquanto manifestação e reconstrução consciente da existência humana, implica a necessária articulação da especificidade do fazer escultórico com as questões centrais de cada tempo. Sem prejuízo da interdisciplinaridade na construção do conhecimento, este facto prescreve uma clara distinção entre os domínios epistemológicos que constroem os discursos sobre a Escultura e a prática escultórica que produz os objectos. A investigação em Escultura pressupõe, assim, uma visão dinâmica da história e do mistério da mão humana, primeiro artefacto da realização e triunfo dessa história.

Conhecer a história e a teoria da Escultura, pública e não pública, requer o estabelecimento das condições de formação desses dois fenómenos de maneira a penetrar o pensamento e as formas plásticas com um olhar escultórico, sendo esse o desbravar do caminho para a formulação da teoria de cada escultor, cortejo de conhecimentos verdadeiramente teórico-práticos e pratico-teóricos que terão a sua materialização primeira no esboceto, ou na maqueta, modelos de uma presença antecipada cujo rigor artístico, ou a falta dele, transparece nesse exacto momento.

No âmbito da referida proposta de investigação em Escultura, foram realizadas dezassete dissertações por nós orientadas, na especialidade de Estudos de Escultura e Escultura Pública, por vezes co-orientadas por professores escultores do Departamento de Escultura. Como parte integrante da investigação em Escultura, decorrente dos dois anos do programa de mestrado, os alunos desenvolveram nos Laboratórios de Escultura um conjunto de objectos escultóricos ou um projecto através de maquetas para realização posterior, como veio a acontecer com a instalação de uma escultura nas imediações da Câmara Municipal de Ourém, ou a instalação de várias outras esculturas no Parque de Esculturas de Moledo. Os temas investigados pelos alunos compreenderam o estudo da espacialidade na escultura contemporânea, seja nas suas relações com a arquitectura ou com a natureza; a pesquisa das relações entre o espaço fechado e o “espaço negativo”; a inserção da escultura na campo da Arte como Experiência e Acontecimento, a partir da obra exemplar de Richard Long; a autorrepresentação na escultura; a descontextualização do objecto e a influência do ready-made na escultura moderna; as relações Forma/ Ideia e Peso/ Leveza na progressiva desmaterialização do objecto escultórico; a escultura pública e a reconceptualização do monumento no campo expandido da escultura, e uma investigação sobre o Belo Ideal e a Teoria da Mimese. Produziram-se ainda investigações monográficas sobre algumas obras singulares ou obra escultórica de escultores portugueses: Dorita Castel-Branco (O Monumento ao Emigrante), Arlindo Rocha, Domingos Soares Branco (a arte sacra no conjunto da sua produção escultórica), Pedro Cabrita Reis e Rui Chafes.

José Carlos Pereira
Professor Auxiliar Agregado

Reflexões sobre o ensino no Mestrado de Escultura

“Posso muito bem, em função dos meus objetivos atuais satisfazer-me com aquilo que a experiência já me forneceu…, mas posso-me convencer facilmente de que nenhuma determinação é a última, que aquilo que já foi experimentado tem ainda, indefinidamente, um horizonte de experiência possível”.1 Nessa medida também as nossas metodologias evoluíram e transformaram-se, sem negar nenhuma delas, mas procurando as suas ligações potenciadoras.

O mestrado em Escultura é recente e tal como o doutoramento foram resultado do Tratado de Bolonha em 1999.
Para existir, o Mestrado em Escultura teria de ser pensado por um Escultor e é neste sentido que este texto começa a ser construído, não só para falar da experiência própria, mas também para homenagear o legado do Professor Catedrático António Matos, mentor dos conceitos do Mestrado e Doutoramento em Escultura. A ideia subjacente a este ensino da escultura será a ligação do ensino clássico das Beaux Arts e o oficinal da Bauhaus.
São reflexões sobre o que pensamos que deve ser o Mestrado em Escultura tendo sido coordenadora do mesmo em 2020/2021e 2021/2023 e tendo lecionado ainda Laboratórios de Escultura e Laboratórios de Escultura Pública.

O Objetivo do Mestrado em Escultura é a investigação em escultura para o desenvolvimento de poéticas pessoais explorando a linguagem e técnicas próprias do escultor.
O Mestrado em Escultura deve ser campo aberto para o pensamento escultórico e os Conteúdos serão explorados de acordo com a expressão plástica de cada um.
Embora essa expressão plástica já tenha sido experimentada pelos mestrandos ou na FBAUL ou noutra instituição durante a licenciatura, pressupõe-se o mestrado como um nível de estudos avançados na prática escultórica e na teoria da escultura.

O mundo está em mudança e a arte acompanha e reflete essas metamorfoses. No caso da escultura, a partir do fim do século XIX e durante todo o século XX constataram-se mudanças significativas como: a perda da narrativa, do pedestal, a mudança do espaço expositivo- do museu ou galeria para a paisagem, a introdução de novas matérias e técnicas.

Apesar da nossa formação académica ter incidido nos metais como matéria-prima, deparámo-nos com condicionantes físicas que nos levaram a outros caminhos que, de forma inesperada, nos puseram a trabalhar o barro, mais tarde a pedra. A nossa experiência no trabalho da pedra através dos processos tradicionais de debaste, ainda que interessante, foi interrompida por ser uma técnica morosa. Mais tarde o uso de máquinas facilitadoras do corte e desbaste da pedra mostraram como é possível executar escultura em pedra com maior autonomia do escultor e rapidez no resultado.
A escultura do fragmento tornou-se tema e processo de trabalho desde o início da nossa atividade. Proporcionando outra atitude ao escultor face à sua especificidade de fronteiras aleatórias, o fragmento está em aberto e sugere múltiplas resoluções. Por estar em nossa opinião, no cerne de várias ruturas fizemos do fragmento a investigação da nossa tese, utilizando uma metodologia de comparação das obras fragmentárias que, no plano histórico e geográfico e no plano processual, marcaram o Sec. XX em Portugal.
Sobre as matérias usadas, a nossa experiência estabelece exatamente uma dinâmica de ligações cujo valor emocional é relevante. Sobre o lado afetivo da relação com a matéria, já em 1954, Luís Pareyson era claro ao dizer que o artista “estuda amorosamente a sua matéria, escruta-a até ao fundo, espreita o seu comportamento e ações”2. Assim sendo, o trabalho do escultor, dialogante com a matéria, é sempre isolado ou melhor solitário.

Hoje a estética contemporânea valoriza abertamente a matéria. Umberto Eco reforça essa posição quando afirma: “Beleza, verdade, invenção, criação não existem unicamente numa espiritualidade angelizada, mas também têm a ver com o universo das coisas que se tocam, que se cheiram, que quando caem fazem barulho…”3 p.402 Podemos verificar que no princípio do século XX o uso das matérias nobres para a escultura era comum em Portugal. Matérias que, na senda do que se passava noutros países, se não foram totalmente abandonadas vieram a ser substituídas por outras. A segunda metade do século XX caracterizou-se pela diversidade de processos e matérias utilizados nas obras escultóricas. Quando falamos de processos tradicionais podemos dizer: modelar, desbastar, fundir. Para nos referirmos aos novos processos, os verbos serão: construir, coser, encher, bordar. As técnicas do serrar, soldar, pregar, furar, colar, combinadas e recombinadas com os processos mais variados, são exemplo de outro pensamento e gestos para a concretização da obra na segunda metade do século XX e século XXI.

Para a escultura foram também relevantes outras disciplinas como a performance, o vídeo e a música que ela soube assimilar. A partir dos anos 60 uma geração de artistas vai rejeitar as formas de arte tradicionais e começa a ligar arte e vida em que o corpo próprio se torna matéria de trabalho. Centrado em si próprio ou refletindo criticamente sobre a sociedade a que pertence o artista hoje quer participar como elemento ativo no mundo que o rodeia.
A Metodologia está ligada ao acompanhamento do projeto escultórico do aluno até à sua materialização final com análise crítica do mesmo.

No ensino do mestrado deve estar presente o pensar a escultura e a prática da escultura. Criatividade e técnica. Na prática escultórica o método é fundamental. Por um lado, porque ajuda a estabelecer tempos para o pensamento do projeto e por outro para a sua concretização em escultura. Métodos e técnicas estão interligados. Os processos e as técnicas para a escultura variam consoante as matérias escolhidas, os tempos de duração de trabalhar em escultura fazem parte do método. Aprender a gerir a disciplina para a concretização atempada da escultura.
Estamos na era da técnica e as novas tecnologias, as digitais, permitem trabalhar a escultura num campo virtual e imaginar, com esses meios, por exemplo, a sua colocação em espaços inusitados não atendendo ao seu peso e massa escultórica. No mundo virtual não há gravidade. É interessante, mas o lugar da escultura é no espaço real contando com o seu peso, a sua massa, a sua fisicalidade evidente que é o que a define e o que constitui a sua essência enquanto obra de arte autónoma.

Ainda com método, os alunos devem investigar obras, textos e teses produzidos por escultores, historiadores, filósofos das artes, desta vez para teorizar sobre a temática escolhida. Escrever, por vezes é dura tarefa para quem escolheu a escultura como forma de expressão, mas é importante saber exprimir por palavras os conceitos e técnicas inerentes às artes plásticas, neste caso à escultura. Para tal a escolha de um tutor que deverá ser mais tarde o orientador torna-se fundamental tendo sempre em mente que orientador e orientando formam uma parceria, uma equipa em que o objetivo será a concretização do mestrado do aluno. Foi criada com sucesso pelo Professor Auxiliar c/Agregação João de Castro Silva a ideia de pequenos seminários apresentados pelos mestrandos no 1º Semestre do 2º ano entendendo essa iniciativa como uma abordagem ao Trabalho de Projeto ou Dissertação Escolhida.

No culminar da experiência formativa do Mestrado em Escultura na FBAUL, a exposição dos trabalhos dos alunos deve ser um momento simbólico expressivo. É o momento da apresentação pública de trabalhos de autoria, de escolha do espaço, do lugar da escultura num espaço partilhado ou no de uma exposição individual.

Por último, cabe uma palavra sobre a experiência de escultora e professora de escultura do ensino superior, onde nos tem sido permitido demonstrar junto dos estudantes as particularidades inerentes aos processos de produção de uma peça escultórica, atravessada pelos procedimentos da exposição e mercado das artes com que precisamos de nos confrontar.
Damo-nos conta que, na relação pedagógica, é exigível, simultaneamente, um saber teórico a par de um saber-fazer que, circularmente, se completam. Nessa relação podemos ver como o fragmento objeto da nossa investigação em escultura resulta como elemento estratégico constitutivo ou construtivo de uma peça escultórica.

1 Husserl, Citado por José A. Bragança de Miranda, Para uma Crítica das Ligações Técnicas, p.260
2 Citado em Umberto Eco, op. cit. p.402
3 Umberto Eco, História da Beleza, p.402

Bibliografia:
Bragança de Miranda, J. M. Para uma crítica das ligações técnicas, Crítica das Ligações na Era da Técnica, Tropismos, Lisboa, 2002
Eco H. História da Beleza, Difel 2004

Luísa Perienes
Professora Auxiliar
PhD Tese de Doutoramento “O Fragmento na Escultura Portuguesa no Séc. XX”

ALUNOS

alexandre piçarra

A minha experiência enquanto aluno do mestrado em escultura foi positiva. Em termos práticos, o ponto de maior relevância foram as aulas de escultura digital. (não me lembro do nome da disciplina em particular)As outras disciplinas expuseram novos conceitos e metodologias criativas na forma de explorar as matérias-primas. A dissertação foi muito enriquecedora a nível de pensamento e compreensão das possibilidades do mundo escultórico.

A metodologia de ensino deixa muito espaço em aberto para que os alunos consigam compreender o que estão a aprender e a desenvolver. Temas semelhantes são explorados por vários alunos, mas não é possível perceber de onde ou de que disciplina esse tema está a ser introduzido.
O propósito fundamental do mestrado só é visível para quem o procura ou para quem faz parte da estrutura acadêmica. De resto, mantém a fórmula da licenciatura em escultura, na qual os alunos estão sujeitos a um sistema que já conhece os seus padrões de pensamento e desenvolvimento prático, e que os deixa desprotegidos na compreensão do que realmente se está a passar com eles.

Este sistema protege a exclusividade da metodologia de ensino da área da escultura e priva os seus alunos da própria integridade de desenvolvimento. Os objetivos individuais de cada aluno estão supostamente em aberto à medida que estes adquirem novas perspectivas de ação e de pensamento, mas não há um destaque para a utilidade do esculpir além do serviço à dimensão expositiva da escultura. Este processo deveria estar ao serviço do propósito universal de procurarmos ser a melhor versão de nós mesmos no nosso contexto e período de vida.
Existe muita preocupação com a dimensão cultural da escultura e o seu espaço expositivo, mas é a dimensão do esculpir que contém a essência prática e útil da escultura, que serviria aos alunos e ao seu futuro independentemente de pretenderem ou não contribuir na área investigativa da escultura.

O ensino deveria proporcionar o expoente máximo da escultura e do esculpir, permitindo que os alunos partam desse ponto para levar a arte ainda mais longe. A matéria e as limitações que ela nos impõe são a única fonte de verdade. O futuro da escultura está condenado à dimensão artificial da “forma pela forma”, mas o sistema de pensamento desenvolvido a partir do esculpir matéria-prima deveria ser o foco essencial do ensino, estimulando a sua transversalidade para todas as circunstâncias. A transversalidade do esculpir como metodologia de pensamento é, contudo, negligenciada.

No contexto português, a área da escultura deve deixar de ser uma sala de exposição com objetos e passar a ser uma universalidade de compreensão: a capacidade de esculpir. Existem ex-alunos que têm empregos fora do seu interesse e utilizam o tempo livre do trabalho para manter a investigação artística, particularmente no contexto escultórico, sem atingirem o retorno desejado de integração no sistema artístico, que lhes permita fazer disso a sua profissão.
Muitos destes ex-alunos estão saturados de um fundamentalismo escultórico e permanecem ao serviço da escultura, sem atingir uma capacidade de compreensão do ato de esculpir a realidade, que lhes permita navegar a sua existência individual e coletiva de forma livre e espontânea, interpretando todas as suas limitações pessoais e impostas como matéria-prima modelável.

Em resumo, o mestrado em escultura proporciona um avanço no caminho da escultura, mas o chão debaixo dos pés, o nevoeiro do doutoramento à frente e o nevoeiro da licenciatura atrás não permitem perceber em que parte do caminho estamos.

Alexandre Piçarra
Mestrado em Escultura, 2020

filipa baptista

As minhas motivações para o mestrado eram inicialmente difusas, especialmente após uma licenciatura marcada, no seu último ano, pelo impacto da pandemia. Identifiquei lacunas a nível prático e teórico que precisava de preencher para evoluir no meu percurso artístico. Ao longo do mestrado, tive a oportunidade de ampliar o meu trabalho prático, ao explorar novas escalas, como as instalações, e assim estudar a sua interação direta com o espaço e o espetador. Essa experiência permitiu aprofundar as perceções e sensações trazidas pela matéria e pelos materiais.

O processo de investigação teórica revelou-se também um espaço de autodescoberta, no qual pude posicionar o meu trabalho artístico e explorar novas áreas de conhecimento, bem como os cruzamentos entre elas. Este processo proporcionou o desenvolvimento de metodologias individuais de trabalho, aprimorar a minha capacidade de organização e de sistematização de conceitos, além de fomentar a criação de interligações entre ideias.

O título "Ambientes Expandidos" surgiu da análise aprofundada do conceito de ambiente, explorado através da imersão física do espetador e do desencadeamento de sensações provocadas pelos ambientes criados pelas obras de arte. A abrangência do termo permite abordagens múltiplas, desde "Ambiente" enquanto atmosfera sensorial até à sua relação com preocupações ambientais. Essa análise foi realizada a partir do estudo de obras que utilizam materiais do quotidiano, matéria natural e referências à paisagem.

Por fim, a minha relação com a escrita sofreu uma transformação significativa durante o mestrado. A escrita tornou-se, para mim, uma ferramenta essencial, quase um manifesto, para consolidar e articular a minha prática artística.

Filipa Batista
Mestrado em Escultura, 2024

hugo maciel

O fundamento da investigação desenvolvida no meu mestrado de Escultura Pública é um apontamento monográfico e de inventariação de vida e obra de João Duarte, antigo professor da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa e que também foi aluno na mesma instituição. A partir da análise de monumentos, troféus e medalhas resultantes da encomenda pública, faz-se uma reflexão sobre as possibilidades tipológicas, de linguagem plástica como também de técnicas e matérias. Complementarmente, define-se uma abordagem respeitante às referências, poética de autor e a actividade docente, de João Duarte, como fundamentais para a compreensão conjunta deste estudo.

João Duarte é um escultor contemporâneo inserido no contexto artístico português na década de 80. Reconhecido nacional e internacionalmente pela área da Medalhística como a sua principal atividade e por uma característica poética de autor, em que o tratamento da figura feminina é dotado de formas redondas e de uma ironia quotidiana. São também as áreas da Escultura de Monumento e Troféu, partes integrantes e fundamentais para o desenvolvimento do seu percurso como escultor.
Ainda que esta dissertação não pretenda ser uma retrospectiva completa da sua vida e obra, um estudo conclusivo e fechado a próximas investigações sobre o tema, definem-se algumas considerações finais.

João Duarte com um currículo artístico vasto, resultante da vontade em criar e pensar a Escultura, desenvolve o seu trabalho tanto dentro como fora do país. É recorrente nele a paixão pelas formas infladas e pela mulher como expressão individual de poética de autor, mas é na prática de tipologias ligadas ao Monumento, Troféu e Medalha que o escultor se firma como marco a par de uma sempre consciente aplicação dos fundamentos plásticos, matéricos e técnicos, dos mais tradicionais aos mais recentes da Escultura. É uma base sólida construída ao longo de trinta anos de carreira, traduzida em mais de quarenta monumentos espalhados pelo país, cento e quarenta medalhas editadas e mais de duas dezenas de Troféus, repostas de instituições públicas e privadas.
A encomenda pública na obra de João Duarte tem sido uma peça basilar para o desenvolvimento da sua carreira como escultor e medalhista e que deu, também, um contributo para as inovações e redefinições dos conceitos da Escultura, particularmente nas Tipologia aqui tratadas (Monumento, Medalha, Troféu), dentro do panorama da Escultura Nacional.

Para além da sua atividade artística João Duarte contribui, na sua carreira docente, para a divulgação e desenvolvimento das práticas técnicas e estéticas da Escultura/Medalhística. Desde os ensinamentos transmitidos aos alunos, em aula, passando pela organização de exposições, conferências, workshops, simpósios e seminários à promoção de protocolos e contratos com instituições públicas e privadas, fazendo de João Duarte um impulsionador das novas gerações e das novas modalidades de que se faz a Escultura Contemporânea.
Ao criar um estudo sobre João Duarte, um escultor, professor e aluno da Faculdade de Belas-Artes, o qual foi também meu professor e uma pessoa basilar na construção do meu percurso artístico, possibilita um aprofundamento e uma proximidade no entendimento do seu percurso artístico e docente, e que se eterniza para próximas gerações que partilham da vontade e da paixão de seguir um percurso artístico na Escultura.

Hugo Maciel
Mestrado em Escultura Pública, 2012

rita dias da silva

O meu nome é Rita Dias da Silva, tenho 25 anos e frequentei o mestrado de Escultura na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa de setembro de 2020 a junho de 2024.
No geral, foi uma experiência bastante positiva e enriquecedora.
Na altura em que entrei, tínhamos um espaço fabuloso para trabalhar, a sala dos arcos, perto de onde são os fornos de cerâmica, atribuído aos alunos do mestrado, que na altura eram poucos, o que potenciou exponencialmente as possibilidades do meu trabalho. Passei bastantes horas nesta sala, desde que a faculdade abria até ao fecho a experimentar e explorar livremente com a matéria no espaço, o que considero ter sido um fator importante para ter gostado tanto deste ciclo de estudos.

Ao contrário de na licenciatura, e apesar de termos todo o apoio da parte dos docentes, tínhamos muita liberdade para errar e perceber qual era o nosso caminho. De facto, o apoio no ano prático do mestrado, vinha apenas quando era solicitado pelos alunos aos docentes, abordagem da qual eu gostei, pois senti-me mais responsabilizada pelo meu percurso, comparando com a licenciatura, que também fiz em Escultura na mesma faculdade.

Eu fiz dois anos de trabalho prático e só posteriormente é que comecei a escrever a dissertação de uma forma mais contínua. O único ponto que considero ter sido menos positivo foi na altura em que tinha disciplinas, senti que a disciplina de teoria da arte que tínhamos não me acrescentou muito em relação ao que aprendi na licenciatura, os temas eram praticamente os mesmos e o currículo de estudos muito semelhante.
Ainda sobre estes primeiros dois anos, queria salientar o apoio fantástico dos técnicos das oficinas, Sr. André e Sr. Eduardo, que para além de apoiar estavam sempre disponíveis para ensinar, com boa vontade. Também saliento as técnicas que aprendi com o professor Viriato, de gessos e a disponibilidade da professora Luísa Perienes.
A parte da escrita foi mais difícil mas tive o apoio incansável do meu orientador, sempre disponível e presente para pensar comigo, o professor Doutor João Castro Silva, que me foi dando pistas e material para encontrar o caminho, ao longo de todo o meu percurso no mestrado.

No fundo, considero que este mestrado é um curso bastante interessante para quem pretende aprofundar a sua prática artística tanto plasticamente como de uma forma informada e consciente da teoria. Os recursos estão lá, ou pelo menos estavam na altura em que era estudante, só é preciso saber utilizá-los, nomeadamente tendo uma postura proativa e trabalhadora.

Rita Dias da Silva
Mestrado em Escultura, 2024

roberto miquelino

O Mestrado de Escultura Pública ofereceu uma perspetiva única, sobre o que realmente significa trabalhar em Escultura Pública, e as diversas fases e modalidades, de uma tipologia extensa e, por vezes, de difícil de compreensão. A possibilidade de trabalhar in loco, em contato direto com uma população, e com o espaço público, foi um processo extraordinário, e permitiu uma aprendizagem inestimável sobre o trabalho em Escultura Pública. Mais ainda, o mestrado permitiu-nos, enquanto alunos, ter um contato direto com alguns dos intervenientes e áreas exteriores à escultura, que são característicos, e necessários de conciliar, com esta tipologia escultórica.

A estruturação concedida ao mestrado, conjuntamente com a concretização de um protocolo com Modelo, no concelho da Lourinhã, permitiu a realização de dois momentos de maior importância na aprendizagem em Escultura Pública: num primeiro momento, o mestrado ofereceu dois momentos distintos, porém conciliatórios, compreendidos no confronto dos alunos com uma teorização genérica sobre a tipologia escultórica, e na possibilidade de trabalhar a escultura pública fora da faculdade, num espaço real, com acesso a oficinas locais (e a um saber técnico mais aprofundado), por um período alargado; num segundo momento, foi facultada a possibilidade de aprofundar o conhecimento teórico, sobre um tema específico, selecionado pelos alunos, mediante sua afinidade, a ser realizado numa dissertação teórica sobre a Escultura Pública.

Dito isto, considero que o Mestrado em Escultura Pública permitiu uma aprendizagem invejável sobre a tipologia em questão, ao possibilitar - e estimular-, uma abordagem dinâmica, com foco no conhecimento prático e teórico.

A capacidade adaptativa do programa pedagógico, o acompanhamento prático/ teórico oferecido aos alunos e a possibilidade de intervir fora do espaço da faculdade foram os grandes protagonistas de um processo de aprendizagem que me foi inestimável, e que me acompanha pela vida enquanto escultor e professor. Também o acompanhamento concedido no momento da reflexão e redação da dissertação, protagonizado em grande parte pelo orientador, e por outros professores do mestrado de escultura pública, foram de enorme importância, e permitiram a aquisição das ferramentas necessárias, para o processo de investigação, reflexão e explanação teórica e científica. Acima de tudo, o mestrado permitiu-me, enquanto aluno, desenvolver o pensamento plástico: a conciliação do aprofundamento técnico com a capacidade de refletir e investigar sobre a escultura desenvolveram a capacidade de pensar a escultura num todo, enquanto forma, conteúdo, linguagem e processo artístico. E essa foi, realmente, a maior valia da passagem do Mestrado em Escultura Pública.

Roberto Miquelino
Mestrado em Escultura Pública, 2012

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